O chamado da vida profissional
A vida profissional é um aspecto presente na vida de quase todo ser humano e com os cristãos não é diferente. Mas, como lidar com isso? Por que e para que trabalhamos? Como lidar com o “sucesso” ou o “fracasso” na carreira? Como Deus se relaciona com nossa vida profissional? Essas são algumas perguntas que pretendemos responder neste pequeno artigo.
Através do trabalho expressamos nossa identidade
A primeira verdade que precisa ficar clara é que o trabalho faz parte do propósito inicial de Deus para o ser humano. Nós trabalhamos porque fomos criados à imagem e semelhança de Deus. Isto é, assim como Deus trabalha (Isaías 64.4; João 5.17), nós trabalhamos também. Veja que Adão foi criado para trabalhar, cultivar o jardim do Éden e dar nomes aos animais (Gênesis 2.15,19-20). Veja também que o que os salvos farão no céu junto com Deus é servir, ou seja, trabalhar (Apocalipse 7.15). O trabalho expressa nossa identidade como criados à imagem e semelhança de Deus porque nos permite exercer criatividade, racionalidade, capacidade construtora e outras características que são oriundas em Deus. Quando o médico cura uma pessoa, quando o engenheiro constrói um prédio ou o advogado faz justiça, eles estão na verdade “brincando de Deus”, fazendo em menor proporção coisas que Deus faz de forma abrangente na sua criação, de forma semelhante ao que fazem os filhos quando imitam os pais. O trabalho do homem relatado em Gênesis e Apocalipse, isto é, antes da queda e depois da glorificação, mostra que o trabalho não é um efeito colateral do pecado.
Para que cada ser humano pudesse exercer o trabalho com qualidade e excelência, Deus nos dotou com talentos e aptidões naturais (Eclesiastes 2.21; Salmo 33.3). Esses talentos devem ser encarados como mais um aspecto da mordomia. Isto é, usar e aprimorar a capacidade que Deus nos deu é uma forma de gratidão e de glorificar ao Senhor. Por isso, fazer cursos, treinar e exercitar a capacidade intelectual, manual, social, esportiva, artística e todas as outras é sinal de honra e respeito ao Criador.
O pecado corrompeu o trabalho
Apesar do trabalho em si não ser um efeito colateral do pecado, a queda do ser humano e seu afastamento de Deus produziram diversas consequências negativas nessa área de nossa vida. O que antes era para Adão e Eva uma atividade apenas prazerosa passou a ser também causa de cansaço e sofrimento (Gênesis 3.17-19). Por causa do pecado, o trabalho também passou a ser instrumento de exploração e opressão. Alguns patrões não pagam salários dignos a seus empregados e os submetem a condições precárias na sua jornada diária. O pecado também fez com que as pessoas usassem a mentira para enganar o próximo nas relações de trabalho. Isso ocorre, por exemplo, através da propaganda enganosa, dos acordos não cumpridos e da infidelidade e falta de compromisso de funcionários para com seus patrões. Outra consequência do pecado na vida profissional é a preguiça e a desvalorização do trabalho. O ser humano caído passa a considerar o trabalho algo sem valor e sem sentido e prefere viver de forma ociosa, o que pode levar à pobreza, sem contar aqueles que se contentam e até se satisfazem em depender de outros para seu sustento. O cristão consciente do risco de entristecer e ofender a Deus pelo mau comportamento na vida profissional trata seus empregados com dignidade, obedece seu patrão com fidelidade, vende seus produtos com verdade, é grato ao Senhor pelas oportunidades e se esforça em obter seu sustento com dedicação.
Nosso trabalho tem um propósito divino neste mundo
Normalmente, os cristãos costumam considerar que aqueles que possuem uma vocação religiosa (pastor ou missionário) e se dedicam integralmente a este ministério possuem um “chamado”. Quem “apenas” trabalha numa profissão “secular” não teria um “chamado”. Entretanto, essa diferenciação deve ser abandonada. Ou seja, aqueles que trabalham numa profissão “não religiosa” também devem encarar seu trabalho com um chamado, uma missão divina. Veja que os textos de Efésios 6.5-8 e Colossenses 3.22-24 são claros em mostrar que os cristãos (naquele contexto escravos, mas que hoje podem ser interpretados como os trabalhadores em geral) quando exercem sua profissão na verdade estão “servindo a Cristo” e “fazendo a vontade de Deus”. Portanto, sua vida profissional é uma maneira de glorificar a Deus, exatamente como faz o pastor ou o missionário. Ou seja, estamos cumprindo uma missão divina ao exercer nossa profissão. Para vislumbrar melhor essa realidade, é importante ver nosso trabalho não apenas como uma tarefa a cumprir, mas como uma forma de atender às necessidades das pessoas pelo serviço. Por exemplo, o cristão não é apenas um advogado, mas é alguém que busca fazer a justiça, assim como Deus também faz. O cristão não é apenas um médico, mas busca promover a cura e o bem estar das pessoas, assim como Deus também faz. O cristão não é apenas um corretor de imóveis, mas tenta ajudar as pessoas a conseguirem um lugar para morar. O cristão não é apenas um motorista de ônibus, mas alguém que ajuda a levar as pessoas para fazer coisas importantes, como estudar, visitar um familiar no hospital ou trabalhar. Essa noção de propósito do trabalho é o que ajuda o cristão a ver sua vida profissional como forma de glorificar a Deus. É claro que isso só se cumprirá se nosso trabalho for feito de forma honesta e não envolver alguma atividade profissional que vá contra a vontade de Deus, como a promoção de vícios, promiscuidade sexual, etc.
Nosso trabalho pode ser um campo missionário
Além de ser uma forma de glorificar a Deus, o trabalho também promove a oportunidade de testemunhar do evangelho de Jesus Cristo às pessoas (2 Timóteo 4.2). Quando lemos o texto de Atos 8.1-4, vemos que enquanto os apóstolos ficaram em Jerusalém, o restante da igreja se dispersou pela Judeia e Samaria, pregando o evangelho por toda a parte. Esses cristãos não eram missionários, mas profissionais, como marceneiros, costureiras e agricultores, que certamente aproveitavam para evangelizar aqueles com quem tinham contato durante o horário do trabalho. Podemos pregar nessas situações, orando e consolando os que estão sofrendo, aconselhando os que estão vivendo conflitos e transmitindo a mensagem de salvação aos que estão em angústia de alma, sedentos e perdidos espiritualmente. Certa vez ouvi a história de um dentista cristão que dava desconto no tratamento se o cliente decorasse alguns versículos impressos no verso do orçamento. Mas, atenção! Alguém que não viva genuinamente em santidade e fidelidade a Deus, como discípulo de Jesus Cristo, não conseguirá alcançar os outros. Além disso, é preciso tomar cuidado para que as ações de evangelização comecem a prejudicar as tarefas que temos em nossa rotina de trabalho.
Nem sempre teremos a carreira sonhada ou o “sucesso” esperado
Assim como algumas pessoas fazem planos para sua vida familiar (casamento e filhos) e para a realização de alguns sonhos (viagens, o lugar onde morar e a aquisição de bens) elas também fazem com relação à vida profissional. Sonham com uma faculdade específica, com uma empresa onde gostariam de trabalhar (ou mesmo abrir uma empresa), com um nível salarial ou com uma especialidade específica na profissão. Outros sonham em seguir uma carreira artística (música, pintura ou teatro), política ou esportiva. Mas, a realidade é que nem sempre as pessoas, e isso inclui os cristãos, conseguirão a carreira sonhada. E outros, ainda que conseguindo a carreira sonhada, não alcançarão o “sucesso” valorizado aos olhos humanos: reconhecimento, bom salário, etc.
Ao invés de sucumbir à frustração e ao lamento, o cristão pode estar em paz e feliz mesmo nessa situação. Isso porque nós sabemos que, não importa a situação, todas as áreas de nossa vida estão nas mãos de Deus e Ele tem um propósito para não nos dar algo que tanto queremos, e que talvez tenhamos até pedido a Ele em oração (Provérbios 16.9; Isaías 55.8-9; Romanos 8.28). É bom ressaltar também que o “sucesso” diante do mundo não significa necessariamente o sucesso diante de Deus. Alguém pode estar sendo reconhecido pelos homens ao mesmo tempo em que é rejeitado por Deus (Lucas 16.13-15). Sabemos que alguém pode ser rico de bens diante dos homens, mas pobre de boas obras diante de Deus. Por isso, o cristão não mede seu sucesso da mesma forma que o mundo, mas pelo fruto do Espírito (amor, paz, alegria, bondade etc.) que produz no trabalho, na família, na igreja e na sociedade como um todo (João 15.8).
Deus é a fonte de nossa prosperidade
Independente de estarmos ou não na carreira sonhada, devemos sempre confiar na provisão de Deus e não apenas em nossa própria capacidade (Provérbios 16.3). Deus pode nos fazer bem-sucedidos mesmo não estando no trabalho dos sonhos ou não exercendo tarefas para as quais nos sentimos mais aptos. Veja como o Salmo 147.10-11 ensina que Deus não se agrada daqueles que confiam em sua própria capacidade, mas dos que esperam nEle. E aqueles que confiam e são fieis a Deus são por Ele supridos e prosperam (Provérbios 3.5-10; Salmo 37.23-26). Mas, como sabemos, a prosperidade que vem de Deus não necessariamente se reflete em dinheiro ou prestígio.
Vejamos o exemplo de José, filho de Jacó. Quando jovem, o rapaz talvez sonhasse com uma carreira de agricultor ou criador de gado. Vendido como escravo pelos irmãos, teve que trabalhar como administrador (na casa de Potifar). Talvez nunca tivesse desejado aquela profissão. Mas sua fidelidade no trabalho o fez prosperar. Com seu exemplo reforçamos a ordem divina de fazer qualquer trabalho da melhor maneira que pudermos (Eclesiastes 9.10). Depois de ser preso e empossado como governador do Egito, teve grande sucesso, não pela própria capacidade, mas porque Deus lhe revelou os períodos de fartura e fome que se aproximavam. Assim, teve sucesso numa carreira em que não sonhava, exatamente porque foi sustentado por Deus.
Fui lendo o texto e lendo as referência bíblicas paralelamente. Fui abençoado do início ao fim. Obrigado por esse texto! Que Deus te abençoe.
ResponderExcluirMuito bom. Deus sempre nos leva a ler coisas edificantes, quando permanecemos no centro da vontade dele. Edificante. Obrigado.
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